Há muito o país anseia por reforma das políticas públicas. O início de um novo governo sempre renova expectativas de que a hora tenha chegado. Esse foi o discurso do então candidato.
No primeiro momento, a população está atenta às propostas do presidente eleito. Após a posse, as suas ações. De particular interesse para retornar o país aos trilhos do desenvolvimento econômico e, por consequência, do bem estar do povo e da paz social: as reformas estruturantes.
Nesse contexto, toma especial proporção a reforma da previdência, para a qual são exigidos dois aspectos igualmente relevantes: o social e o fiscal.
A previdência, em sentido geral, pressupõe a garantia de renda ao cidadão, e à sua família, quando ele deixa de reunir as condições ideais de obtê-la com seu trabalho. Divide-se então a população em três grandes grupos, segundo sua condição de trabalho: pré-laboral, laboral e pós-laboral.
A dificuldade inicia na determinação da primeira fronteira: qual seria a melhor idade para demarcar a passagem da primeira para a segunda? Na mesma linha de raciocínio, qual a melhor para deixar a segunda etapa e passar à terceira e última? Em tal ambiente, parece fundamental o diálogo entre toda a sociedade civil para definir as faixas etárias mais adequadas para as passagens de uma a outra.
O artigo 10 da Constituição Federal do Brasil (CF) prevê a participação de trabalhadores e empregadores nas questões profissionais ou previdenciárias. O rito de passagem do período laboral para a aposentadoria deve considerar a capacidade de trabalho em cada grupo de atividades profissionais, e a possibilidade de geração de renda do cidadão para si e sua família, associado às expectativas de longevidade do grupo social que este cidadão está inserido. Esse o debate social.
Neste ponto aparece outro aspecto, tão importante quanto o primeiro: a capacidade de financiamento da previdência social, exercida pelo estado em nome da sociedade, que paga a conta pelos impostos recolhidos. É o debate fiscal. Um não pode ser discutido sem levar em conta o outro, para que se determine a sustentabilidade do sistema. Se, por um lado, o apelo social preponderar, poderá assegurar direitos sem reunir as condições necessárias ao seu financiamento. Lado outro, o aspecto fiscal isoladamente poderá asfixiar aposentados e pensionistas. A atenção à sustentabilidade do sistema está expressa no parágrafo 5º do artigo 195 da CF:
“Nenhum benefício ou serviço da seguridade social poderá ser criado, majorado ou estendido sem a correspondente fonte de custeio total”.
Para melhor deliberação das idades fronteiriças às etapas da vida do cidadão, deverá ser estimada a longevidade média da população. Aqui entra a ciência atuarial. E essa entrada está prevista na CF, no artigo 40, que trata da previdência dos servidores públicos (federal, distrital, estadual e municipal), e no artigo 201, que trata da previdência social dos trabalhadores nas empresas privadas. Em ambos, idêntica determinação: devem ser
“(...) observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial (...)”.
A pergunta que naturalmente daí decorre é: por qual razão a CF é desprezada quando o assunto é reforma da previdência? Em todas as reformas implantadas, trabalhadores e empregadores foram ignorados, contrariando o artigo 10. Também os atuários deixaram de ser ouvidos, em confronto com os artigos 40 e 201. No atual Projeto de Emenda Constitucional (PEC) nº 287/2016, a mesma lógica: uma equipe do Ministério da Fazenda (sem qualquer demérito a esses profissionais) elabora estudos econômicos, com objetivos exclusivamente fiscais, sem ouvir trabalhadores e empregadores e sem o imprescindível concurso de estudos atuariais que fundamentem o financiamento dos benefícios nas condições em que forem implantados.
Essa breve exposição remete a um dos grandes desafios dos novos representantes do executivo e do legislativo nacionais: apresentar um projeto de reforma da previdência social estabelecidas em bases sólidas da CF: 1) que respeite o artigo 10, promovendo ampla discussão com trabalhadores e empregadores, o que pode ser conseguido em diálogos com o Conselho Nacional de Previdência Social – CNPS; e 2) que os resultados sejam apreciados após estudos realizados segundo os melhores estudos técnicos envolvendo aspectos demográficos, biométricos e financeiros. Naturalmente que conduzidos sob a responsabilidade de profissionais atuários legalmente habilitados no país, o que pode ser verificado junto ao Instituto Brasileiro de Atuária (IBA).
Definido o novo presidente – e todos os membros das duas casas legislativas – que governará o país, é hora de preparar uma proposta consistente de reforma da previdência, cumprir a Constituição no sentido de realizar estudos atuariais e ser discutida com empregados e empregadores além de colocada em audiência pública. O texto resultante de contribuições de toda a população será então submetido à aprovação no Congresso Nacional para, finalmente, ser promulgada a nova previdência social, no melhor interesse da população.
É o que propomos e esperamos!
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